Xico Sá
Com a morte de Wando, a música brasileira perde o seu professor titular de educação sentimental para as massas. A ausência do cantor mineiro não nos deixa órfãos. Pior: nos deixa brochas.
Homem que é homem chora e bebe essa morte até os cotovelos perfurarem a insensível fórmica do balcão do botequim mais próximo.
Em tempos de marmanjos vacilões e promessinhas metrossexuais de salão ("ai se eu te pego"), Wando representava a convicção da pegada mais erótica e sincera do cancioneiro romântico.
Não à toa, morreu na condição de curador do maior acervo de calcinhas do planeta -seu sonho era fazer um museu das peças.
A lição do professor Wando aos jovens apressados que sempre comem o cru e nunca o bom cozido das relações afetivas: "O amor é paciência e elegância", disse, em entrevista recente a Edson Franco, na "IstoÉ Online".
Atenção senhores pais e autoridades do MEC: a lírica de Wando merece figurar no próximo exame do Enem. Melhor jeito de formar sentimentalmente as novas gerações.
Na pedagogia do autor de "Fogo e Paixão", o macho falhar na alcova era algo humaníssimo. Coisa que o homem dos tempos enviagrados das ereções artificiais não parece admitir. "Afago teus cabelos/ Beijo tuas costas e nada/Caem dos meus olhos/Duas lágrimas geladas", cantava.
Para as fêmeas, Wando representava não apenas a resistência à frouxidão masculina como também a nostalgia de um certo cavalheirismo que já foi para as cucuias. Com ele no palco, as moças -mesmo as de passado muito fortes- se sentiam cortejadas como na primeira vez.
O artista sabia que a cantada é como a revolução de Mao Tse-tung. Tem que ser permanente. Ele cantava todas o tempo inteiro.
A democracia do xaveco geral e irrestrito atingia até a ambiguidade erótica dos belos travestis do centrão de São Paulo, como testemunhei em um show no Largo do Arouche. Gênio. O amor é mesmo paciência e elegância.
Nelson Gonçalves morreu, Waldick Soriano morreu, Wando morreu e o macho romântico brasileiro não está passando muito bem.
Publicado na Folha de S.Paulo, em 09/02/2012.
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