Evelyn Berg Ioschpe
A notícia da Folha de 25 de abril
dando conta de que faltam professores em 32% das escolas estaduais é um escândalo
em si mesma.
Que outra instituição se daria ao
"luxo" de abrir as portas com apenas dois terços de seu contingente?
Imagine-se a linha de montagem de uma
indústria que vai lançar um novo produto com um contingente rebaixado em 32%.
Que tal um automóvel com três rodas como produto final? E que tal um aluno
manco para explicar o que significa esse índice vergonhoso?
E por que a maior carência incide justamente
sobre a disciplina de arte? São 85 escolas estaduais funcionando sem professor
de arte na capital de São Paulo.
E, no Brasil, apenas cerca de 20% dos
professores em exercício têm formação em artes.
Apesar de a arte ser uma disciplina
obrigatória desde 1996, apesar de a formação específica em artes ser
obrigatória para o professor da área e apesar, ainda, de o Ministério da
Educação ter acelerado a oferta de cursos de graduação em arte através da
Capes, temos esse quadro clamoroso de insuficiências.
Ou seja: o Brasil é pródigo em produzir leis
de efeito, mas muito lento ao implementá-las e mesmo cobrar a sua efetivação.
Um estudo do Banco Mundial revela que as
"habilidades do século 21" são cruciais para a próxima geração de
trabalhadores do Brasil.
São elas: a capacidade de pensar
analiticamente, de fazer perguntas críticas, de aprender novas habilidades, de
operar com alto nível de habilidades interpessoais e de trabalhar eficazmente
em equipes.
O estudo mostra ainda que a melhoria da
qualidade dos professores no Brasil exigirá o apoio ao melhoramento contínuo da
prática, entre outras questões.
É exatamente isso que o Instituto Arte na
Escola vem fazendo de Norte a Sul do Brasil, através de parcerias com 47
universidades há mais de duas décadas.
Temos nos ocupado em manter programas de
educação continuada para professores de arte de escolas públicas, reunindo
1.700 professores nos grupos de estudos que mantemos em nossa rede de
universidades parceiras, de forma a atualizar a sua prática, receber supervisão
e realizar "peer learning" (aprendizagem entre pares).
O Instituto Arte na Escola fornece materiais
pedagógicos e um site (www.artenaescola.org.br) de apoio atualizado e
interativo, rico em oportunidades de pesquisa e colaboração entre os pares.
Mais de 40 mil professores formam, pelo site,
uma comunidade de aprendizado que se sente respaldada em seu exercício
profissional.
Esses professores que hoje optam por se
reciclar continuamente nas nossas universidades parceiras já seriam uma festa
em qualquer disciplina. Mas sabendo, como hoje se sabe, que aprender através
das artes evita a repetência e a evasão (e traz efeitos significativos para a
aquisição de conhecimentos também em outras áreas), as razões para comemorar
são ainda maiores.
E talvez sirvam como contraponto a este
desalento que nos fica do pouco caso com que a Secretaria de Educação de São
Paulo trata o ensino de arte no Estado que é o carro-chefe da economia do país.
Um Estado que necessita de profissionais com
pensamento analítico, aptos a fazer perguntas críticas e a aprender novas
habilidades. Gente criativa para um século 21 que aponta um novo lugar possível
para o país que era um gigante adormecido.
EVELYN BERG IOSCHPE, socióloga, é presidente da Fundação Iochpe e do
Instituto Arte na Escola
Publicado na Folha de S.Paulo, em 07/05/2012.
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